DEZ ANOS ATRÁS, A FRANÇA

era o destino da minha primeira viagem para fora do Brasil. Uma colega do trabalho e eu fomos fazer um curso para aprimorar conhecimentos em biblioteconomia. Assim, não se tratava de uma viagem de férias, mas a trabalho. A maior parte dos dias, passávamos em sala de aula ou visitando bibliotecas. O grupo era formado por gente de toda parte do mundo: do Brasil passando por Filipinas, Quirguistão, Vietnã, Jordânia, Yêmen, Chade, Lituânia, Argélia, Alemanha. Bem interessante ter contato com jovens de lugares tão diferentes.

Ficamos um pouco em Paris e depois um mês em Marselha. A cidade era linda ao mesmo tempo em que espantava, por sua viva mistura de povos e línguas; as pessoas falavam da criminalidade e da máfia. Desconhecidos nos abordavam no meio da rua. Garçons nos restaurantes não nos tratavam bem. Ainda assim, tudo era novidade e valia a pena se aventurar pelas ruas do centro, pelas ladeiras dos bairros próximos. Engraçado se deparar com o sotaque típico do sul da França, que não se escutava tanto nos cursos de língua, centrado no padrão parisiense. A paisagem, igualmente, se diferenciava.

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As cores do Mediterrâneo, tons de azul e verde; a terra bege, as flores e plantas  –tudo vivendo com toda a força o tempo quente… Essa é uma das poucas fotos que me sobraram da viagem.

Era verão: depois das aulas tínhamos tempo de sol para perambular pela cidade. Os fins de semana eram a oportunidade para pequenas excursões: Cassis, Aix-en-Provence, ilhas na região: a prisão de Conde de Monte Cristo. Numa delas, encontramos ruínas romanas.

Curtimos a Fête de la Musique, até tarde da noite. Era novo pra mim ver toda uma cidade fora de casa, na rua, ao som de música (algo parecido em São Paulo seria a Virada Cultural?). Festinhas de bairro também aconteciam. Visitamos a família de um amigo da nossa chefe. Lá, conversei com um garotinho que aprendia provençal na escola — e me surpreendia com a semelhança com a língua portuguesa.

Eu queria experimentar de tudo — principalmente os sabores de iogurte, os biscoitos, pães, geleias e chocolates. Voltei para casa com 5 quilos a mais! A mala, abarotada de souvenirs, livros, herbes de Provence, sabonetes (sobretudo savon de Marseille), relógio, roupas, cartões postais… Era como se eu quisesse preservar as cores, cheiros e sabores para além daqueles dias. Fotografei inúmeros rolos de filme — e comprei minha primeira câmera digital, que me acompanhou por anos.

Fiz um diário da viagem: anotava as experiências e sonhos; desenhava. Dia a dia, telefonava para casa e o namorado.

Depois de quatro semanas em Marseille, passamos poucos dias em Poitiers. Lá, nos hospedou uma família francesa, que nos levou conhecer igrejas românicas e nos ofereceu refeições maravilhosas. Novamente interessante, como contraponto — Poitiers nublada em confronto a Marselha dourada de sol.

Em Paris ficamos pouco tempo mas fizemos o roteiro básico, torre Eiffel, bateau mouche, Montmartre, Père Lachaise, museu d’Orsay. Eu queria muito ir a Auvers-sur-Oise, onde está enterrado Van Gogh. Mas chegamos lá no fim do dia e já estava tudo fechado. O mesmo aconteceu em Versailles: nos perdemos no caminho e passamos da hora.

Eu poderia fazer vários posts sobre essa viagem… Mas vale ainda dizer que, além dos passeios, o importante da viagem foi experimentar viver fora de casa, conviver com outras pessoas, com as diferenças, as opiniões divergentes. Até então, não havia passado por algo assim: estar longe da família e dos amigos. Eu me achava muito independente mas me surpreendi ao chorar quando me despedi da minha mãe.

Também me surpreendo com a marca que a França deixou em mim. Naquela época, eu estudava francês sem uma especial fascinação. Foi uma escolha necessária durante o curso de Letras. Eu já falava inglês e a cultura francesa me parecia interessante — mas não mais do que a italiana ou a alemã, por exemplo (na verdade, quando comecei o curso de Letras minha intenção era estudar grego antigo… história para outro momento). Aos poucos me engajei tanto que trabalhava numa biblioteca francesa, anos depois dava aula e meu mestrado acabou sendo em literatura francesa — coisas que não vislumbrava de início.

Voltando à França, relembro com alegria dos passeios que fiz por lá. E me realegro ainda ao voltar a fazer novamente outro passeio lá, dez anos depois do primeiro.

ESSA HISTÓRIA TODA

de acordo ortográfico, além de movimentar a máquina editorial, as caras consultorias empresariais e dar assunto de conversa em quase todas as rodas (seja na fila do banco, seja no curso de Letras, seja no Jornal Nacional), faz as pessoas pensarem na língua ou não?

Penso nisso além de tudo porque fui ao Museu da Língua Portuguesa esses dias, ver a exposição do Machado (sempre Machado).

No acervo fixo do museu, aquela projeção de poemas, o de Gregório de Matos, muito bem interpretado e realizado com apuro visual, é o único que vem acompanhado da referência da época em que foi escrito: “século 17”. Isso porque seria facilmente confundido com um rap de hoje em dia?


do pouco que conheço, gosto dele, sabe…

Agora com as modificações do acordo, como ficam todas as apresentações fixas do museu? Terão que ser readequadas? Nossa, que trabalhão vai dar.

Não gosto muito das mudanças a que temos que nos submeter: como diferenciar a pronúncia de teia e ideia? Ai que triste…

Será que nessa correção o pessoal do museu vai alterar a grafia de caraoquê (na lista de palavras de origem asiática) para karaokê, como todo mundo usa? Fora o museu e o dicionário Houaiss, poucos são os que ousam escrever caraoquê. Caraoquê me lembra piteça, forma que um daqueles gramáticos doidos queria que fosse dada a pizza.