MEDO DE INSETOS

seja de abelhas, pernilongos, baratas — nós, pessoas, seres humanos, grandes e desenvolvidos, sentimos a ameaça desses animais tão pequenos, mas complexos e cheios de poderes que não temos: voam, sobem paredes, carregam muito peso, trabalham organizadamente em grupo. Eles nos picam, nos machucam, sugam o sangue, incomodam o sono, destroem plantas.

Esses dias tive um sonho, como vários outros sonhos que já tive com insetos (como esse e esse por exemplo) e o tema me voltou à mente. Nos dias quentes, há muitas abelhas e vespas nos passeios que faço com o Francisco. Algumas noites aparecem baratas e pernilongos para nos chamar a atenção: ei, não estamos sozinhos aqui, não comandamos e controlamos tudo.

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Durante a primeira consulta no homeopata, já faz quase 10 anos, ele perguntou: “do que você tem medo?” Uma das respostas certeiras foi: abelha. Quando pequena, acontecia de eu ter muito pavor delas: tinha um copo de refrigerante à mão, saía correndo, jogava o copo para qualquer lado, os olhos cheios de lágrimas — tudo isso porque uma abelha me cercava, atraída pelo doce da bebida que eu segurava. Levei uma ferroada anos e anos depois, em outra situação muito diferente, já longe dos refrigerantes.

Estou tentando encarar o fato, até porque, agora mãe, a gente precisa por um lado proteger e por outro dar exemplo. Não quero esconder meus medos, mas preciso também não ceder a eles. Entendê-los, resolver o que eles significam. Ainda assim, dou um grito frente a barata. Me esquivo quando sinto abelha por perto. Ligo o ventilador no quarto para espantar os pernilongos. Mas também percebo que estou mais tolerante com os insetos. Não os mato mais como antes. Isso veio com o marido, que prefere pegar os bichinhos e soltá-los fora de casa do que dar uma chinelada. Deixo algumas teias de aranha na janela de casa. Até vou observando o desenho que muda, se não me engano, de acordo com o tempo, se chove, se faz calor (coisas do Manual do escoteiro mirim).

Num dos sonhos que tive, percebi que de nada vale matar um inseto, porque eles são inúmeros: um deles equivale a todos os outros, foi o raciocínio que me veio. E, na verdade, eles são como nós, seres frágeis e fortes, aqui nesse mundo, levando sua efêmera vida, cheia de percalços, delícias e encontros. Abro os olhos para entender o que eles nos dizem.

“SEMPRE PRECISEI DE UM POUCO DE ATENÇÃO”

é a primeira frase de “Teatro dos vampiros”, música do Legião urbana. Criança entre os anos 80 e 90, escutava muito no rádio os sucessos da banda. Sem me considerar uma fã deles, conheço a letra de muitas das canções — dentre tantas,  essa é uma das mais marcantes.

“Dezesseis” apareceu num sonho e o já falei de “Teatro dos vampiros” em outro post: não lembro mais do pesadelo, mesmo assim a letra música volta à mente de tempos em tempos. Só que, agora, em vez do trecho “voltamos a viver há dez anos atrás”, fico pensando mesmo no comecinho: “sempre precisei de um pouco de atenção, acho que nem sei quem sou, só sei do que não gosto”. Fui até atrás de uma análise da letra — na verdade, mais interessante é a prévia à interpretação, a historinha por trás da música, a referência a Entrevista com o Vampiro de Anne Rice, etc. etc. Dar uma única leitura a uma canção como essa reduz seus significados. De toda forma, é um esforço muito válido.

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A foto é retirada da versão acústica da música, aqui.

Pensando em mim, sempre busquei contato com outras pessoas, por mais que também tenha meus momentos de solidão. Preciso falar, e assim é necessário alguém do outro lado que me escute, entenda, me dê um retorno. Tive a sorte de ter boas amizades que me davam essa oportunidade; discutia também muito a relação ao longo dos namoros. Nos últimos tempos, tenho tentado recorrer menos a essas conversas. Mantenho em mim as ansiedades, receios e reflexões. Talvez seja coisa dessa fase adulta da vida, mãe e distante das pessoas com quem vivi muito tempo. A escrita é uma das formas de lançar palavras ao outro, de pedir atenção, nem que seja de mim mesma, no futuro: — Ei, Ana Amelia ali na frente, leia-me!

OS PRIMEIROS TRÊS MESES GRÁVIDA

eu passei cansada, dormindo e com enjoo — pouco além disso!

O cansaço era tanto que não conseguia caminhar até a esquina. Algo muito forte! Larguei um freela, deixei de lado uma aulas que estava fazendo, ficava em casa o tempo todo. Vi alguns filmes, mas a atividade principal era dormir.
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Tinha uns sonhos bem diferentes — pesadelos inclusive… Lembro de um sonho fofo: bebê vestidx de vermelho que falava tudo no diminutivo: engraçadinho, bonitinho, espertinho…

Acordada, o que tomava conta era o enjoo. Todos os odores me rodeavam. Era uma aventura sensorial! Sentia o cheiro das coisas mais distantes. Enjoei do sabonete que eu estava usando. As comidas também tinham outro gosto. A sensação estranha me fez até perder uns quilos…

Diziam que gengibre ajudava; tomava no chá. Mas no fim das contas não segui muitas receitas; fui levando.

Durante mais ou menos um mês, essa situação era bem intensa. Foi se dissipando na passagem pro quarto mês, quando voltou a energia… sobre esse momento, faço outro post.

ERA UMA VEZ

uma menina que escrevia; ela passava o dia todo pensando nas histórias que ia contar aos amigos: os passeios, os sonhos que ela teve com eles, com personagens de outras histórias, com diretores dos filmes que iam ver no cinema, matando aula; juntava desenhos que encontrava por aí, fotos e cartões postais perdidos no meio dos livros que ela espanava nas estantes; salvava imagens de sites perdidos na internet.

Ela tinha um jeito de escrever que não existe mais – diz um leitor, que sabe de cor um texto dessa menina, que ela mesma desconhece; texto lindo esse, que ele não consegue mais encontrar em lugar nenhum.

UMA NOVA MOEDA

de 25 centavos apareceu. Entrou em circulação. Ela era redondinha, gordinha, amarela, da cor da estrelinha (do Super Mario ou a “estrelinha mágica” da Turma da Mônica). Bom, justamente no jogo do Mario há moedinhas pelo caminho, assim como no Donkey Kong deveríamos ir pegando todas as bananas que apareceriam.

Com ela, era possível tirar dinheiro dos telefones públicos. Bastava colocar (meio escondidos nos orelhões dava para descobrir um buraco para essa moeda) e saía dinheiro. Moedas de todos os valores. Estávamos na usp e a gente ia atrás de todos os orelhões tirar dinheiro que estava ali escondido, como um tesouro que piratas poderiam ter deixado para o futuro.

Lembrei agora que esse sistema se assemelha muito a um brinquedo que eu tinha, o Boca Rica. As moedas, a gente colocava e não sabia quando a portinha se abriria liberando tudo o que ele guardava.

DURANTE A PROJEÇÃO

de Viajo porque preciso, volto porque te amo, me veio o sonho que eu tive, talvez hoje mesmo, talvez poucos dias atrás. Eu já sabia, hoje de manhã me lembrei, que eu sonhei que era preciso regar as plantas. Eu regava, via a água entrar por meio da terra, os vasos transparentes me mostravam o caminho da água. Também sonhei com um banho de chuveiro que me desagradou. Muita água para me dizer que eu estava com a garganta muito seca, de respirar pela boca. O nariz entupido. Mas isso tudo não foi durante o filme.

Em meio às estradas do nordeste de Viajo…, me veio que eu sonhei com Bye Bye Brasil, que eu não assisti, ou se assisti não lembro.

Vi no filme o que posso estar vendo em outros lugares: um álbum, feito de recortes e vozes perdidas. Destoa quando o tom muda: quando a música não é mais do rádio do carro, quando a narração vira entrevista. E recortes de um diário, como preparação de outra coisa – dos filmes de Karim Aïnouz e de Marcelo Gomes. Preparação que vemos depois dos filmes que se seguiram essa viagem, essa coleta de imagens e visitação de um imaginário.

Na volta para casa fiquei puxando a história do meu sobrenome. E descobri que talvez ele tenha vindo do nada.

OS GÊNEROS

principais cabem em “O segredo de seus olhos”, no imdb: thriller, romance, drama, comédia, filme de crime; ainda reúne uma lista de “palavras-chave” curiosas. Uma me pareceu interessante: “local blockbuster”.
Podia ter uma palavra-chave assim: “funcionalismo público”. Caberia como uma luva!
O diretor, além dos filmes com toques de engajamento, também dirige seriados para a tevê nos eua, descobri isso agora também. Assim como Darín participou de um episódio de Chiquititas argentina.

O filme, como essa maneira de falar dele, é um pretexto. O filme me fez pensar em deixar um caderno bem do lado da cama, e anotar o que vem no sonho. Que sonho ele teve naquela hora? Parece que esse sonho, se foi colocado no filme, é feito para que nos esqueçamos dele. Boa sacada do roteiro, dentre tantas.

Além disso, uma pequena ponte entre O segredo de seus olhos e O filho da noiva: a questão do tempo longo que passa mas que não apaga nada; parece que traz de volta algo quando na verdade nunca esse algo nunca foi embora. Guardar um caderno em branco, um recorte de jornal esperando o dia em que ele vai dizer alguma coisa. Dizer porque o tempo passou.

NA VIDA, NO SONHO

qual a diferença?

A gente tenta olhar nos sonhos coisas que nos façam sentido, colocamos nossa linguagem a serviço deles. Do mesmo jeito, acreditamos que nossa vida dá alimento aos sonhos. Eu me preocupo com as aulas, logo, tenho um pesadelo de uma aula fracassada.

Hoje durante uma consulta me lembrei de um sonho e me preocupei com o conteúdo: eu estava toda fraturada. Pés e mãos principalmente. Marcas roxas, dificuldade de locomoção. Sem me perguntar o que tinha me acontecido para eu estar daquele jeito, eu continuava a fazer as coisas, a andar, lamentando um pouquinho a limitação.

Posso ter me preocupado com um fantasma, uma imagem que me cerca, a da fratura. Mas por que o conteúdo mais óbvio do sonho seria o significado que ele carrega? E por que haveria algo no sonho a ser desvendado, uma resposta a ser decifrada?